Não é à toa que se conversa. Talvez a maior parte das conversas que temos sirvam, efectivamente, para transmitir uma mensagem. Digo isto porque muitas das que tenho fazem-me duvidar da efectividade de transmissão do texto. Sei que isto é uma "heresia" em termos comunicativos mas não consigo deixar de o pensar. Ainda hoje tive uma graaaaande conversa que resultou em menos que nada. Creio que foi o que se pode chamar uma conversa de surdos. Ou talvez se trate mesmo do que estivemos a discutir, relacionado com a pragmática conversacional - aquela coisa em torno da metalinguística, aquilo de "sintonizar" as cabeças e as sentenças. Pensando bem, talvez os teóricos tenham alguma razão.
Adiante. Temos conversado acerca da comunicação e, dentro desta, de canais ascendentes, descendentes, temos andado a ver do que se trata, afinal, de enviar textos dentro de uma empresa, para o nosso público interno. Falamos de conceitos diversos, afloramos o endomarketing e, na realidade, tudo não é senão uma simples coisa: a necessidade de nos fazermos entender.
Mas é fazermo-nos entender que não é tão simples como isso. Quantas vezes dizemos que "Fulano não compreendeu o que eu lhe disse"? Na minha opinião, essa pergunta, por si só, é falaciosa. Tenho por norma nunca perguntar "percebeste o que te disse?", mas sim "Fiz-me entender?". É diferente.
É que, vendo bem as coisas, se alguém não compreendeu o que eu lhe transmiti, é por um único motivo: porque eu não expliquei bem. Podemos mesmo estar a tentar explicar algo a uma criança ou a alguém completamente ignorante, até mesmo a um indivíduo com algum tipo de anomalia psíquica. A minha opinião é que, uma vez mais, se ele não entendeu é porque eu não me fiz entender. Daí a famosa expressão "Explica-me isso como se eu fosse muito burra" que andou a circular numa campanha publicitária.
As empresas têm a sua visão, a sua missão, a sua estratégia. Fazem o seu planeamento. Tentam transmitir todos esses conteúdos ao trabalhador por meio das mais diversas ferramentas. No entanto, continuamos a verificar falhas de interpretação e a consequentes quebras de produção, volume de vendas, etc. Tudo porque, aparentemente, "o pessoal não conseguiu interiorizar" as expectativas.
Neste sentido, a comunicação é quase um valor em si. É incontornável na criação de valor para a organização onde se desenvolve e que desenvolve. É imprescindível para a consecussão de resultados óptimos para a organização e para os seus trabalhadores.
Lamentavelmente, está ainda longe de ser considerada como o deve ser.
A realidade é que grande parte das empresas estão ainda muito compartimentadas e operam ainda no modelo de "dois pisos". Esta situação observa-se com especial incidência no sector produtivo onde existem três classes: a dos "Senhores Doutores", a dos "Senhores Engenheiros", a dos "Empregados do Escritório" e, finalmente, uma inevitável quarta, a do "Operariado" ou "Pessoal".
Neste contexto cultural, a comunicação é barrada por um sem número de factores e, muitas das vezes, os objectivos da organização não chegam da melhor forma ao pessoal mais subalterno. Daí a existirem clivagens, por vezes fortes, entre a visão da organização por parte de uns e de outros, é um instante.

Quando falamos do planeamento de uma qualquer coisa, digamos de uma escada, o que é habitual é que exista um desenho original dessa escada, feito pelo arquitecto. Este, por sua vez, há-de o entregar a alguém, provavelmente um engenheiro, para que proceda à sua execução. Cabe a este último o estudo dos métodos e processos a colocar em prática para que a tarefa possa ser concluída com um máximo de eficiência pelo que deve considerar todas as envolventes relacionadas com logística, recursos humanos, escolha de materiais e ferramentas etc.
Este estádio do processo deve-se ao facto de ter existido uma conversa entre o arquitecto e o engenheiro que lhe passou o desenho para a mão, explicando-lhe de forma objectiva quais as suas expectativas em relação à empreitada.
O engenheiro, tendo interiorizado esta expectativa e tendo já cuidado de todos os trabalhos prévios à construção, dá o plano desta obra ao seu melhor profissional, ao que crê ser o mais habilitado, mais perfeito e eficiente. Aparentemente, nada mais há a fazer senão esperar que o trabalho da escada se complete e que o profissionalismo do funcionário, aliado à boa capacidade de gestão do engenheiro dêem frutos, podendo este passar a circular pelo resto da obra que, por acaso, até tem trabalhos muito mais complexos que este.
No final do dia o funcionário vai ter com o engenheiro e, sorridente, diz-lhe que o trabalho está pronto e que ficou muito bom. Confessa-lhe até que foi dos melhores que fez até hoje. O engenheiro, contente e confiante, pergunta-lhe ainda assim se seguiu e conseguiu cumprir o plano que lhe tinha entregue, a cópia do desenho do arquitecto. A resposta é entusiástica. Que sim, que tudo ficou "tal e qual", que lhe deu um pouco de trabalho mas que está "um brinco".
Bom... não se pode dizer que o funcionário não tenha feito um bom trabalho. Aparentemente, fê-lo até bem demais, cumpriu e superou a expectativas que nele tinham depositado: as da reprodução fiel do plano do desenho original, símbolo habitual do seu perfeccionismo. De fora ficaram alguns símbolos que, no catálogo de convenções do operário, tinham significações diferentes das do engenheiro e do arquitecto.
Compreendeu mal? Não creio. Explicaram-lhe mal, não se fizeram entender? Tenho a certeza que sim.
E, no fim, isto não foi nada que uma pequena conversa não pudesse ter evitado...
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